Um produto ideológico faz parte de uma realidade (natural ou social ) como todo o corpo físico, instrumento de produção ou produto de consumo; mas, ao contrário destes, ele também reflete e retrata uma realidade, que lhe é exterior. Tudo o que é ideológico possui um significado e remete a algo situado fora de si mesmo. Em outros termos, tudo o que é ideológico é um signo. Sem signos não existe ideologia
(Mikhail Bakhtin, Marxismo e Filosofia de Linguagem)
Alguns comentários sobre o meio e a mensagem na internet.

domingo, 30 de junho de 2013

Occupy Brazil - Como o Tio Sam pretende meter a mão em nosso bolso e roubar a democracia





Olho no dinheiro. Em síntese, esse é o conselho de quem conhece de perto décadas de truques e artimanhas usados pela CIA e por outras organizações do governo estadunidense para virar o jogo político alheio.

William Blum, mais conhecido como Bill, é norte-americano e anti-imperialista convicto, graças à guerra do Vietnã.

Foi quando ele se tornou funcionário do Departamento de Estado, durante a guerra, que teve um choque de consciência. O que já era uma convicção se tornou conhecimento ainda mais profundo quando acompanhou, no Chile, o golpe de estado orquestrado pela CIA contra o governo de Salvador Allende, em 1973.

Por enquanto, não há qualquer indício de ação externa nas manifestações brasileiras, embora — estranhamente — brasileiros tenham tomado a iniciativa de denunciar o Brasil, em vídeo, no Exterior.

Porém, momentos de instabilidade política — como os enfrentados agora pelos governos da Turquia e do Brasil — prenunciam mudanças e atores externos muitas vezes se aproveitam da conjuntura para enfiar sua colher. Por isso, fomos ouvir Blum.

Escritor, historiador e crítico contumaz da política externa dos Estados Unidos, Bill Blum não usa meias palavras para descrever a atuação da superpotência.

No livro Killing Hope: U.S. Military and CIA Intervention since World War II, ele faz um relato detalhado da intervenção estadunidense em vários países. Blum dedica um capítulo a cada nação, começando com a China. Depois de percorrer todos os continentes, ele termina, no capítulo 55, com o Haiti. Passa, claro, pelo golpe militar no Brasil e pelos similares na vizinhança.

Blum se encaixa na longa lista de “dissidentes” do império, que inclui do ex-agente da CIA Philip Agee ao soldado Bradley Manning e, mais recentemente, o ex-funcionário terceirizado da CIA Edward Snowden, que vazou dados sobre os programas de espionagem em massa do governo de Barack Obama.

Por conta de ter denunciado o poder, Blum vive uma espécie de “exílio branco”: seus livros nunca são resenhados e suas ideias nunca são reproduzidas na mídia local. A não ser em circunstâncias extraordinárias: em 2006, num audio tape, Osama bin Laden citou um dos livros de Blum, Rogue State, e o autor foi parar na capa do Washington Post.



No trecho do livro mencionado por Osama, Blum descreve o que faria para acabar com os ataques terroristas se fosse eleito presidente dos Estados Unidos:


“Primeiro eu pediria desculpas — publica e sinceramente — a todas as viúvas e órfãos, os empobrecidos e torturados e todas as milhões de vítimas do imperialismo norte-americano. Depois eu anunciaria que todas as intervenções globais dos Estados Unidos — inclusive os terríveis bombardeios — teriam fim. E informaria Israel que o país deixaria de ser tratado como um estado da União, mas — estranhamente — como um país estrangeiro. Depois eu reduziria o orçamento militar em pelo menos 90% e usaria o dinheiro para pagar reparações às vítimas e reconstruir os danos das invasões e bombardeios norte-americanos. O dinheiro seria suficiente. Sabe qual é o orçamento militar de um ano dos Estados Unidos? É mais que 20 mil dólares por hora para cada hora desde que Jesus Cristo nasceu. Isso é o que faria em meus primeiros três dias na Casa Branca. No quarto dia, eu seria assassinado”.

Aos 70 anos de idade, Blum continua muito ativo. Agora, toca o site www.williamblum.org.

Na entrevista, ele disse que não sabe se organizações norte-americanas (National Endowment for Democracy, Freedom House e semelhantes) tiveram algum contato com manifestantes no Brasil. Mas acha importante que os brasileiros fiquem atentos. Ao se depararem com um grupo, um site, uma organização nova, tentem descobrir quem está financiando o grupo.

Só assim, seguindo a trilha do dinheiro, é possível descobrir quem está por trás de certas palavras de ordem e campanhas.

No caso das organizações dos Estados Unidos, o objetivo segundo Blum é sempre o mesmo, há décadas. Garantir, no poder, representantes fiéis aos interesses econômicos de Washington. A ideologia pouco importa. Contanto que o mercado, e as mercadorias, continuem circulando na direção certa. “Os Estados Unidos não estão nada preocupados com liberdade e democracia e sim com a dominação do mundo. Esta é a política externa dos Estados Unidos”.

William Blum é autor de vários livros sobre a política externa dos Estados Unidos e suas consequências. Antenado nas movimentações e protestos em diferentes países do mundo, ele nos deu a seguinte entrevista:

Viomundo – Sobre os protestos no Brasil e na Turquia, o senhor vê alguma dessas organizações – National Endowment for Democracy (NED), United States Agency for International Development (USAID) ou Freedom House – tentando participar, direcionar o movimento político?

BB – Não sei quão ativas essas organizações são no Brasil. Mas parto do princípio de que são porque todas elas são a mesma coisa. Todas seguem o exemplo da National Endowment for Democracy, que foi criado claramente para ser uma fachada da CIA. E esse é o papel que vem desempenhando nos últimos 25 anos, mais ou menos. Estão no mundo inteiro. E têm vários braços, como o National Democratic Institute e o International Republic Institute, que são todos parte do NED, criado nos anos 80 para fazer, abertamente, o que a CIA estava fazendo secretamente. O NED é simplesmente uma organização de fachada para a CIA. Mas não sei quão ativos eles são hoje no Brasil. Não estou acompanhando de perto.

Viomundo – Então, me permita reformular a pergunta. Se o senhor fosse brasileiro, sabendo tudo que sabe a respeito da maneira como o império opera, em que sinais estaria de olho, agora, enquanto estão acontecendo todos esses protestos no país?

BB – Eu procuraria saber quem está pagando as contas. Quem está financiando isso ou aquilo. Que Organizações Não Governamentais estão ativas. Pode ser que surjam nomes conhecidos, ou alguns mais obscuros. Mas é preciso pesquisar para descobrir quem está financiando essas organizações mais obscuras. Pode ser que você encontre a ligação com o NED.

Viomundo – Como o senhor com certeza sabe, existe essa nova “coalizão” entre o Departamento de Estado e as grandes empresas da internet, como o Google, para desenvolver ativismo digital no mundo. Todos participando com o mesmo objetivo que, dizem, é promover a democracia.

BB – Eu escrevi sobre o homem do Google, que era do Departamento de Estado. No Google ele se encarrega, entre aspas, de promover a democracia aqui e ali. Mas para essas organizações e o NED, o que eles chamam de democracia é simplesmente capitalismo. Eles trabalham contra qualquer movimento socialista que veem, por definição, como antidemocrático. E promovem o mercado livre, que na definição deles é democracia. Então, você tem que prestar atenção no que eles dizem porque frequentemente usam os mesmos termos quando defendem a democracia.

Viomundo – Que semelhanças o senhor vê entre o que está acontecendo no Brasil e na Turquia? Com toda essa insatisfação dos jovens, que não estão vendo perspectiva? O senhor vê uma insatisfação com a vida que estamos levando hoje? Um esgotamento do modelo neoliberal?

BB – Olha, não sei qual é o grau de sofisticação dos manifestantes, desses jovens. Acho que muitos talvez tenham dificuldades de explicar contra o que são e a favor do que, apesar de terem uma boa reação intuitiva. Eles sabem que a sociedade os frustrou porque não conseguem encontrar um emprego, não lhes deu uma educação adequada pela qual possam pagar, não lhes deu um padrão de vida adequado. Eles sabem disso tudo, mas não necessariamente sabem exatamente qual é a conexão com o neoconservadorismo ou o liberalismo. Mas o instinto está lá e deveria acontecer o mesmo aqui nos Estados Unidos. Mas os jovens aqui, em sua maioria, ainda não acordaram. Com exceção do movimento Occupy que foi bom enquanto durou. Mas não chegou ao ponto de fazer demandas específicas.


Viomundo – E o movimento Occupy não conseguiu mobilizar um número grande de pessoas…

BB – O movimento Occupy foi esmagado pela polícia. Eles esmagaram um local ocupado após o outro. Prenderam mais de mil pessoas. Bateram em centenas de pessoas. Muitas tiveram sérios problemas de saúde por conta disso. Então, não é tão ruim como parece. Os jovens aqui não são tão apolíticos como se pensa. Eles têm que se recuperar do esmagamento do movimento. A polícia tomou até as bibliotecas deles e jogou os livros fora. Isso é um comportamento fascista. O governo americano hoje, na minha opinião, é um estado policial. Então, não é tão ruim como se pensa. Não sei o que vai ser preciso para que o movimento Occupy acorde novamente. Mas estou esperando por isso.



Viomundo – O senhor acha que é por conta desse estado policial que é ainda mais difícil, aqui, brigar por mudanças?

BB – A polícia no Egito ou na Turquia não foi exatamente boazinha e gentil. A polícia, no mundo todo, é bem ruim. Mas os jovens da Turquia, do Brasil e do Egito têm sido bem mais corajosos, continuam voltando. Foram espancados, seus acampamentos esmagados, e continuam voltando. Aqui, depois que foram esmagados, no fim de 2011, ainda não voltaram. Mas estou esperando que algo aconteça.


Viomundo – E as revoluções coloridas na Georgia, na Ucrânia e na Bielorrússia, quando a participação das organizações norte-americanas foi muito bem documentada? Elas investiram uma boa quantidade de dinheiro para unir a oposição ou garantir a vitória deste ou daquele candidato. Qual foi o resultado?

BB – Se a democracia era o grande objetivo dessas revoluções coloridas, não temos muito do que falar. A Georgia é um dos muito exemplos e não é exatamente uma sociedade muito livre. E o homem que era o líder da revolução, [Mikheil] Saakashvili, não é muito bem quisto agora. Mas eles todos aprenderam, uns com os outros. As organizações norte-americanas que se envolveram, como NED e Open Society [do especulador George Soros], levaram pessoas da Iugoslávia para ensinar os manifestantes da Georgia, por exemplo, para dividir com eles a experiência a respeito de como derrubaram o governo [de Slobodan] Milosevic [na Sérvia, em 2000]. Você pode chamar a isso de conspiração internacional, o uso de um país para derrubar o sistema de outro. E isso tudo foi coordenado pela organização que mencionei, o NED, e pelo Departamento de Estado.

Viomundo – No fim, qual foi o resultado? O que os Estados Unidos ganharam?

BB – O propósito é sempre instalar governos que serão ativos confiáveis para Washington. O objetivo, certamente, não é democracia e liberdade. O objetivo é garantir que os que estão no poder sejam bons clientes de Washington. É nisso que você tem que prestar atenção em todos esses lugares. Não examine quem está mais ou menos feliz. Olhe apenas quão subserviente aos Estados Unidos ou à OTAN é o novo governo.

Mais e mais, esses governos estão entrando na OTAN. Nesse sentido, tem sido um sucesso do ponto de vista de Washington. Os Estados Unidos cercaram a Rússia de membros da OTAN. E eles ainda não terminaram. Ainda querem colocar a Georgia e a Ucrânia na OTAN. É um processo em andamento para cercar a Rússia de amigos da OTAN. E é um dos motivos pelos quais a Rússia não entrega o Edward Snowden a Washington [Snowden é o ex-funcionário terceirizado da CIA que denunciou o programa secreto dos Estados Unidos de coleta de dados telefônicos e da internet, no mundo]. Eles têm muito motivo para estarem com raiva de Washington. Parece até que a Guerra Fria não terminou.

Viomundo – Considerando a sua história, em particular, quando deixou o Departamento de Estado, o senhor revelou os nomes e endereços de 200 funcionários da CIA, em 1969. O que teria acontecido com o senhor em 69, se as coisas estivessem como estão hoje, haja visto o que está acontecendo com Bradley Manning, Julian Assange, Edward Snowden…

BB – Não tinha pensado nisso. Consegui não ser punido. A mesma coisa hoje me deixaria com problemas graves. Não sei nem se faria a mesma coisa hoje. Talvez tivesse medo. Não sei. Mas se fizesse, sofreria sérias acusações na justiça.

Viomundo – Como foi que essa mudança aconteceu no país? Ela foi gradual?

BB – A transformação dos Estados Unidos em um estado policial foi gradual, mas se acelerou com o Obama. Ele se tornou um grande adversário de várias liberdades civis. O governo dele processou mais gente responsável por vazamento de informações do que todas as administrações anteriores somadas. E ainda não parou. Agora, um general [reformado, James Cartwright] está sendo processado porque vazou informações sobre o que os Estados Unidos fizeram com o programa nuclear do Irã. Eles puseram vários vírus no sistema de computador do programa. O general pode ter sido a fonte que revelou o programa há alguns anos e agora está sendo atacado. Obama parece obcecado em barrar todo tipo de vazamento de informação.


Viomundo – O senhor acha que isso é responsabilidade do presidente Obama? Não teria acontecido no governo de outro presidente? Isso não é um processo que ocorre nos Estados Unidos, não importa quem seja o presidente ou o presidente tem condições de barrar esse processo?

BB – Ele pode barrar. Ele tem o poder. Ele tem o poder de soltar todos os presos de Guantánamo. Tem o poder de suspender todos os ataques com drones e todas as guerras. Ele não usou esse poder. Ele vai entrar para a história como o responsável por todas essas coisas. Não pode fugir dessa responsabilidade.

Viomundo – Uma vez que você tem todas essas organizações (NED, Freedom House e outras) operando no mundo, elas ganham vida própria? Ou tudo isso é bem controlado pela Casa Branca?

BB – Você não pode absolver a Casa Branca de responsabilidade porque se essas organizações não estivessem fazendo o que devem fazer, não receberiam mais dinheiro [o NED é financiado pelo Congresso dos Estados Unidos com dinheiro público]. O fato de continuarem recebendo dinheiro mostra que o trabalho delas está sendo aprovado pela administração. Então, não se pode separar o governo dessas organizações. É a trilha do dinheiro. Sempre.

FONTE: 

quinta-feira, 27 de junho de 2013

É de Chorar nos KANTinhos - Crítica da Razão Burra


CRÍTICA DA RAZÃO IMPURA OU O PRIMADO DA IGNORÂNCIA





Em crítica da razão impura ou O primado da Ignorância, Millôr Fernandes faz uma análise minuciosa de dois livros publicados por dois ilustres políticos e escritores brasileiros: José Sarney (Brejal dos Guajas) e Fernando Henrique Cardoso (Dependência e Desenvolvimento na América Latina). Ambos também ilustres presidentes da República. Sem entrar no mérito de suas atividades políticas, Millôr entra – e profundamente – no mérito de suas, digamos assim, experiências literárias. O resultado é um livro altamente elucidativo, o que, diga-se de passagem, não é o caso dos textos examinados.

Antes de debruçar-se sobre esta crítica literária, Millôr Fernandes publicou meia centena de livros, colaborou em todos os veículos de comunicação importantes do país nos últimos 50 anos, criou, traduziu e adaptou exatamente 117 peças de teatro, além de ter produzido uma das obras gráficas mais importantes entre os desenhistas, caricaturistas, ilustradores e humoristas brasileiros.
Ah, Millôr é considerado por muitos o maior galhofeiro nacional.


Trechos do livro Crítica da Razão Impura ou o Primado da Ignorância de Millôr Fernandes:

Sobre Dependência e Desenvolvimento na América Latina, de Fernando Henrique Cardoso:

"(...) De uma coisa ninguém podia me acusar – de ter perdido meu tempo lendo FhC (superlativo de PhD). Achava meu tempo melhor aproveitado lendo o Almanaque da Saúde da Mulher. Mas quando o homem se tornou vosso Presidente, achei que devia ler o Mein Kampf (Minha Luta, em tradução literal) dele, quando lutava bravamente, no Chile, em sua Mercedes (‘A mais linda Mercedes azul que vi na minha vida’, segundo o companheiro Weffort, na tevê, quando ainda não sabia que ia ser Ministro), e nós ficávamos aqui, numa boa, papeando descontraidamente com a amável rapaziada do Dops-Doi-Codi. (...)"

Sobre Brejal dos Guajas, de José Sarney:

"(...) Brejal dos Guajas só pode ser considerado um livro porque, na definição da Unesco, livro ‘é uma publicação impressa não-periódica com um mínimo de 49 páginas’. O Brejal tem 50. Materialmente, Sir Ney excedeu-se em uma página. Contam os íntimos que o ‘escritor’, depois de vinte anos de esforço, bateu o ponto final na página 50 e gritou, aliviado, pra dona Kyola: ‘Mãiê, acabei!’(...)"

terça-feira, 25 de junho de 2013

Os Cegos e o Elefante - O Dharma (a Lei) dos Ignorantes







Geralmente, vemos a célebre símile dos cegos e do elefante presente no Tittha Sutra (Ud. VI.4) livremente citada como um argumento a favor de abandonar toda e qualquer investigação, análise individual do Caminho em seu estudo, prática e fruição.

De fato, este sutra é muito valioso e importante, para ambas as tradições do Buddhismo do Norte e do Sul, sendo parte do volume do Udana, que juntamente com o Dharmapada, Itivutakka e Sutta Nipata, partes do Khuddaka Nikaya do Cânone Pali, constituem os textos mais antigos e traçáveis na história do Buddhismo, tendo sido compilados e escritos por volta de 200 anos após a morte do Buddha. No Buddhismo Tibetano, boa parte do conteúdo paralelo a estes está no Udanavarga, compilado por Dharmatrata e parte importante do currículo básico monástico tibetano até hoje.

Abaixo a símile do elefante, do Tittha Sutra (Ud VI.4):


“Certa vez, aqui mesmo em Savatthi, houve um certo rei que disse para um certo homem, ‘Reúna todas as pessoas de Savatthi que sejam cegas de nascença.”

“’Sim, majestade,’ o homem respondeu e reunindo todas as pessoas de Savatthi que eram cegas de nascença, ele foi até o rei e ao chegar disse. ‘Majestade, as pessoas de Savatthi que são cegas de nascença foram reunidas.’

“’Muito bem, então mostre-lhes um elefante.’“’Sim, majestade,’ o homem respondeu e mostrou um elefante para as pessoas cegas. Para alguns dos cegos ele mostrou a cabeça do elefante, dizendo, ‘Isto é um elefante.’ Para outros ele mostrou a orelha do elefante , dizendo, ‘Isto é um elefante.’ Para outros ele mostrou uma presa … a tromba … o corpo ... um pé ... a parte traseira … o rabo … o tufo na ponta do rabo, dizendo, ‘Isto é um elefante.’

“Então, tendo mostrado o elefante para as pessoas cegas, o homem foi até o rei e ao chegar disse, ‘Majestade, as pessoas cegas viram o elefante. Faça aquilo que julgar adequado.’

“Então o rei foi até onde estavam as pessoas cegas e ao chegar perguntou, ‘Pessoas cegas, vocês viram o elefante?’

“’Sim, majestade, nós vimos o elefante.’

“’Agora digam-me, pessoas cegas, como é o elefante.’

“As pessoas cegas para as quais havia sido mostrada a cabeça do elefante responderam, ‘O elefante, majestade, é igual a um jarro para água.’

“Aquelas para as quais havia sido mostrada a orelha do elefante responderam, ‘O elefante, majestade, é igual a um cesto para trilhar.’

“Aquelas para as quais havia sido mostrada a presa do elefante responderam, ‘O elefante, majestade, é igual a uma lâmina de um arado.’

“Aquelas para as quais havia sido mostrada a tromba do elefante responderam, ‘O elefante, majestade, é igual à haste de um arado.’

“Aquelas para as quais havia sido mostrado o corpo do elefante responderam, ‘O elefante, majestade, é igual a um celeiro.’

“Aquelas para as quais havia sido mostrado o pé do elefante responderam, ‘O elefante, majestade, é igual a um poste.’

“Aquelas para as quais havia sido mostrada a parte traseira do elefante responderam, ‘O elefante, majestade, é igual a uma argamassa.’

“Aquelas para as quais havia sido mostrado o rabo do elefante responderam, ‘O elefante, majestade, é igual a um pilão.’

“Aquelas para as quais havia sido mostrado o tufo na ponta do rabo do elefante responderam, ‘O elefante, majestade, é igual a uma vassoura.’

“Dizendo, ‘O elefante é assim, não assado. O elefante não é assado, é assim,’ eles golpearam uns aos outros com os punhos. O rei se deliciou com o espetáculo.

“Do mesmo modo, bhikkhus, os errantes de outras seitas são cegos e sem visão. Eles não compreendem aquilo que é benéfico e aquilo que é prejudicial.

Eles não entendem o que é o Dharma e o que é o não-Dharma.

Sem compreender aquilo que é benéfico e aquilo que é prejudicial, sem entender o que é o Dharma e o que é o não-Dharma, eles permanecem envolvidos em rixas e brigas, mergulhados em discussões, apunhalando uns aos outros usando as palavras como adagas, dizendo, ‘O Dharma é assim, não assado. O Dharma não é assado, é assim.’”

Então, dando-se conta do significado disso, o Abençoado nessa ocasião exclamou:

Alguns dos assim chamados brâmanes e contemplativos,
estão profundamente apegados às suas próprias idéias;
as pessoas que apenas vêem um lado das coisas
se envolvem em brigas e disputas.




Qual o contexto deste sutra?

Tal discurso teria sido dado pelo Buddha no Bosque de Jeta nas proximidades da cidade de Savatthi, aos seus discípulos monásticos que relatam o que viram na cidade comos os errantes de outras seitas/religiões se engalfiavam em suas especulações metafísicas do tipo:


“O mundo não é eterno” ...
“O mundo é finito” ...
“O mundo é infinito” ...
“A alma e o corpo são a mesma coisa” ...
“A alma é uma coisa e o corpo é outra” ...
“O Tathagata existe após a morte” ...
“O Tathagata não existe após a morte” ...
“O Tathagata ambos existe e não existe após a morte” ...
“O Tathagata nem existe, nem não existe após a morte.
Somente isso é verdadeiro; todo o restante é falso.”

Diante deste relato o Buddha conta para seus discípulos monásticos a história dos cegos e o elefante.

Só que a conclusão do Buddha não é uma exortação ao abandono da investigação:


“Do mesmo modo, bhikkhus, os errantes de outras seitas são cegos e sem visão.

Eles não compreendem aquilo que é benéfico e aquilo que é prejudicial.

Eles não entendem o que é o Dharma e o que é o não-Dharma.

Sem compreender aquilo que é benéfico e aquilo que é prejudicial, sem entender o que é o Dharma e o que é o não-Dharma, eles permanecem envolvidos em rixas e brigas, mergulhados em discussões"

Portanto, esta conclusão do Buddha que acompanha a símile nos exorta de fato à responder a nós mesmos, diante do seu ensinamento, em teoria, prática e fruição as seguintes perguntas:




Compreendo aquilo que é benéfico e aquilo que é prejudicial?
Compreendo o que é o Dharma e o que é o não-Dharma?

Somente quando estivermos certo da nossa resposta para estas perguntas, no centro de cada um de nós, seremos como um cego livre de sua cegueira, a ver de fato o elefante diante de nós.

Link para o Tittha Sutta: http://www.acessoaoinsight.net/sutta/UdVI4.php

domingo, 23 de junho de 2013

A Revolta dos Zumbis - Eles não sabem de onde vieram e nem para onde vão






Por Sidney Braga


Oito dicas pra não pagar mico em tempos de Manifestações:


1- Não compartilhe o vídeo dos atores da Globo contra Belo Monte. Esse vídeo de 2011 está cheio de informações falsas. Inclusive alguns atores que gravaram o vídeo se arrependeram depois de descobrir que o que eles disseram não era bem assim.


2- Não diga que foram gastos 30 bilhões em estádios. Na verdade, foram gastos 7 bilhões, que é coisa pra caramba. Desses 7 bilhões, grande parte é emprestado pelo governo federal, mas a maior fatia será paga pela iniciativa privada. Os outros 23 bilhões foram investimentos em infraestrutura, transporte e aeroportos. Inclusive, o investimento em transporte é uma das reivindicações dos protestos.


3- Nunca peça pro governo gastar com saúde o mesmo que se gastou com estádio de futebol. Nos 7 anos de preparação para a Copa, foram gastos aproximadamente 7 bilhões com estádios. Neste mesmo período, foram gastos mais de 500 bilhões com saúde. Então se vc fizer isso, na prática vc ta pedindo pra reduzir consideravelmente os gastos com saúde. Gastos com saúde nunca são demais. Então cuidado pra não pedir a coisa errada.


4- Não peça um presidente pra garantir que algum político seja preso. Isso é papel do poder Judiciário. O manifesto deve ser endereçado a este poder.


5- Não peça um presidente pra impedir a votação de uma lei ou PEC. Isso é prerrogativa do Congresso. O manifesto deve ser endereçado aos parlamentares.


6- Não peça um presidente pra cassar o mandato de algum deputado ou senador. Isso é papel das casas legislativas. Está escrito no artigo 55 da Constituição Federal.


7- Nunca peça pra fechar o Congresso e acabar com os partidos. O último presidente que fez isso foi um Marechal. Tal ato aconteceu em 1968 e foi nada menos do que o temido AI-5 da ditadura.


8- Não compartilhe aquelas informações falsas sobre o auxílio reclusão. O auxílio reclusão é um benefício pago à família do detento que contribuiu com o INSS, logo ele está recebendo um valor pelo qual já pagou anteriormente. O detento deve ser punido, não sua família.



terça-feira, 18 de junho de 2013

Esquerda, Direita Esquerda, Direita Meia Volta Volver...A Criminalização dos Movimentos Sociais




Projeto de lei do senador Marcelo Crivella propõe que protestos durante a Copa sejam considerados terrorismo, com penas de 15 a 30 anos

A reação da classe política aos protestos da sociedade realizados nos últimos dias não demorou, e um projeto de repressão, de autoria dos senadores Marcelo Crivella (PRB-RJ), Ana Amélia (PP-RS) e Walter Pinheiro (PT-BA), apresentado em 2011 pode voltar à pauta do Congresso Nacional nos próximos dias.

O PL 728/2011 prevê que manifestações durante a Copa das Confederações, que está acontecendo este mês, e Copa do Mundo, que será realizada em 2014, sejam tratadas como atos de terrorismo e limita o direito dos trabalhadores à greve.

O texto do projeto na página do Senado diz que a lei “define crimes e infrações administrativas com vistas a incrementar a segurança da Copa das Confederações FIFA de 2013 e da Copa do Mundo de Futebol de 2014, além de prever o incidente de celeridade processual e medidas cautelares específicas, bem como disciplinar o direito de greve no período que antecede e durante a realização dos eventos, entre outras providências”.

As penas previstas no projeto variam entre 15 a 30 anos, e especifica que questões ideológicas sejam enquadradas em crimes de terrorismo. Diz o texto do PL 728/2011: “Terrorismo. Art. 4º Provocar ou infundir terror ou pânico generalizado mediante ofensa à integridade física ou privação da liberdade de pessoa, por motivo ideológico, religioso, político ou de preconceito racial, étnico ou xenófobo: Pena – reclusão, de 15 (quinze) a 30 (trinta) anos”.

Na justificativa do projeto, os autores afirmam que “a tipificação do crime ‘Terrorismo’ se destaca, especialmente pela ocorrência das várias sublevações políticas que testemunhamos ultimamente, envolvendo nações que poderão se fazer presente nos jogos em apreço, por seus atletas ou turistas”. O dicionário Michaelis define sublevação, como “incitar à revolta, insurrecionar, revolucionar [...] revoltar-se”.

O projeto de lei contraria o artigo 5º da Constituição Federal, que garante o direito à livre manifestação nas ruas e praças públicas.


Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XVI – todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente;

A repercussão da existência do projeto nas redes sociais foi completamente adversa. Uma petição pública foi publicada através da ONG Avaaz, exigindo que o PL 728/2011 seja modificado.

Manifestantes criticaram o projeto classificando-o como autoritário: “Quando eles vão aprender que medidas totalitárias só irão piorar a situação (deles)?”, escreveu o internauta Fabiano Pereira, numa página no Facebook. “Isso é Brasil. Essas e outras baixarias vão acabar. O povo acordou!”, complementou Vinício Gollin Sena.

Segundo a Agência Senado, uma enquete com internautas detectou que a maioria das pessoas que souberam do projeto reprovaram a ideia. O levantamento foi realizado entre os dias 16 de abril e 1º de maio, e 67% das pessoas se colocaram contrários à proposta, e 33% se disseram favoráveis.

O sentimento de que a proposta não será levada adiante da maneira que está foi expressado pelo internauta Bruno Araújo: “Isso aí não vai sair do papel, e mesmo que por um acaso do destino acabe saindo, vai tomar uma ADIN (Ação Direta de Inconstitucionalidade) imediatamente”.

Por Tiago Chagas, para o Gospel+

segunda-feira, 10 de junho de 2013

Noam Chomsky - Destruindo o planeta sem querer querendo










Publicado originalmente no Common Dreams.

POR NOAM CHOMSKY

O que será do futuro, provavelmente? Uma ideia razoável para saber pode ser olhar para a espécie humana de fora. Então, imagine que você é um observador extraterrestre que está tentando descobrir o que está acontecendo aqui, ou imagine que você é um historiador daqui a 100 anos – supondo que existirão historiadores daqui a 100 anos, o que não é óbvio – e você estará olhando para o que está acontecendo hoje. Você veria algo bastante notável.

Pela primeira vez na história da espécie humana, nós claramente desenvolvemos a capacidade de nos destruir. Isso tem sido verdadeiro desde 1945. Agora estamos finalmente reconhecendo que há processos de mais longo prazo, como a destruição ambiental que conduz na mesma direção, talvez não a destruição total, mas pelo menos a destruição de uma existência decente.

E há outros perigos, como pandemias, que têm a ver com a globalização e a interação. Portanto, há processos em andamento e instituições ideais, como sistemas de armas nucleares, para levar-nos a sério golpe, ou talvez o término de uma existência organizada.

Como destruir um planeta sem querer

A questão é: o que as pessoas estão fazendo sobre isso? Nada disso é um segredo. Na verdade, você tem que fazer um esforço para não ver.

Tem havido uma série de reações. Há aqueles que estão se esforçando para fazer alguma coisa sobre essas ameaças e outros que estão agindo para sua escalada. Se você verificar quem eles são, esse historiador do futuro ou observador extraterrestre iria ver algo realmente estranho. Tentando mitigar ou superar essas ameaças estão as sociedades menos desenvolvidas, as populações indígenas, ou o que restou delas, sociedades tribais e as primeiras nações do Canadá. Eles não estão falando de uma guerra nuclear, mas do desastre ambiental, e estão realmente tentando fazer alguma coisa.

Na verdade, em todo o mundo – Austrália, Índia, América do Sul – há batalhas acontecendo, por vezes, guerras. Na Índia, é uma grande guerra sobre a destruição ambiental direta, com sociedades tribais que tentam resistir a extrações de recursos que são extremamente prejudiciais localmente, mas também tem suas conseqüências gerais. Em sociedades onde as populações indígenas têm uma influência, muitos estão tomando uma posição. O movimento mais forte no que diz respeito ao aquecimento global está na Bolívia, que tem uma maioria indígena e normas constitucionais que protegem os “direitos da natureza”.

O Equador, que também tem uma grande população indígena, é o único exportador de petróleo onde o governo está buscando ajuda para manter o petróleo no solo, em vez de produzir e exportar – e o chão é o lugar onde ele deveria estar.

As sociedades mais ricas e poderosas da história do mundo, como Estados Unidos e Canadá, estão correndo a toda velocidade para destruir o meio ambiente o mais rápido possível.

O presidente venezuelano, Hugo Chávez, que morreu recentemente, foi objeto de zombaria, insulto e ódio de todo o mundo ocidental quando participou de uma sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas, há alguns anos, em que chamou George W. Bush de diabo. Ele também fez um discurso bastante interessante. Claro, a Venezuela é um grande produtor de petróleo. O petróleo é praticamente todo o seu produto interno bruto. Nesse discurso, ele alertou para os perigos do uso excessivo de combustíveis fósseis e pediu aos países produtores e consumidores para se reunir e tentar descobrir formas de reduzir o uso de combustíveis fósseis. Isso foi muito surpreendente vindo de um produtor de petróleo. Você sabe, ele era parte indígena. Ao contrário das coisas engraçadas que disse, esse aspecto de suas ações na ONU nunca foi sequer relatado.

Assim, em um extremo você tem as sociedades indígenas, tribais, tentando conter a corrida para o desastre. No outro extremo, as sociedades mais ricas e poderosas da história do mundo, como Estados Unidos e Canadá, correndo para destruir o meio ambiente o mais rápido possível.

Ambos os partidos políticos americanos, o presidente Obama e a mídia internacional parecem estar olhando com grande entusiasmo para o que chamam “um século de independência energética” nos Estados Unidos. A independência energética é um conceito quase sem sentido, mas deixemos isso de lado. O que eles querem dizer é: teremos um século para maximizar o uso de combustíveis fósseis e contribuir para destruir o mundo.

Na verdade, quando se trata de desenvolvimento de energia alternativa, a Europa está fazendo alguma coisa. Enquanto isso, os EUA, o país mais rico e poderoso na história do mundo, são a única nação entre as 100 mais relevantes que não tem uma política nacional para restringir o uso de combustíveis fósseis e nem sequer tem metas para as energias renováveis. Não é por que a população não queira. Os americanos estão muito perto da norma internacional em sua preocupação com o aquecimento global. Interesses comerciais não permitem isso e são esmagadoramente poderosos na determinação da política.

Então é isso o que o futuro historiador – se houver – veria. Ele também pode ler revistas científicas de hoje. Mas cada uma que você abre tem uma previsão mais terrível do que a outra.

“O momento mais perigoso na História”

A outra questão é a guerra nuclear. É sabido há muito tempo que, se houvesse um primeiro ataque de uma grande potência, mesmo sem retaliação, provavelmente isso destruiria a civilização apenas por causa das conseqüências do inverno nuclear que se seguiria. Você pode ler sobre isso no Boletim de Cientistas Atômicos. Assim, o perigo sempre foi muito pior do que pensávamos que era.

Acabamos de passar o 50º aniversário da Crise dos Mísseis de Cuba, que foi chamado de “o momento mais perigoso da história” pelo historiador Arthur Schlesinger, assessor do presidente John F. Kennedy. E era mesmo. Era um alerta, e não o único. Em alguns aspectos, no entanto, a coisa mais desagradável é que as lições não têm sido aprendidas.

O que aconteceu na crise dos mísseis em outubro de 1962 foi enfeitado para parecer que atos de coragem abundavam. A verdade é que todo o episódio era quase insano. Houve um momento, quando a crise chegava ao auge, que o premiê soviético Nikita Khrushchev escreveu a Kennedy oferecendo-se para liquidar a crise em troca do anúncio público da retirada dos mísseis russos de Cuba e dos mísseis americanos na Turquia. Na verdade, Kennedy nem sabia que os EUA tinham mísseis na Turquia naquele momento. Eles estavam sendo retirados de qualquer maneira porque seriam substituídos por submarinos nucleares Polaris, mais letais e invulneráveis.

Essa foi a oferta. Kennedy e seus assessores a consideraram – e rejeitaram. Kennedy estava disposto a aceitar um risco muito elevado de destruição em massa, a fim de estabelecer o princípio de que nós – e só nós – temos o direito de ter mísseis ofensivos além das nossas fronteiras, na verdade em qualquer lugar que quisermos, não importa o risco. Nós temos esse direito e mais ninguém.

Khrushchev tinha de ser humilhado e Kennedy tinha de manter sua imagem de macho. Ele é muito elogiado por isso: a coragem e a frieza sob ameaça e assim por diante. O horror de suas decisões não é sequer mencionado.

Um par de meses antes de a crise explodir, os Estados Unidos tinham enviado mísseis com ogivas nucleares a Okinawa. Estes foram apontados para a China durante um período de grande tensão regional.

Bem, quem se importa? Temos o direito de fazer o que quisermos em qualquer lugar do mundo. Essa foi uma lição cruel daquela época, mas outras viriam.

Dez anos depois, em 1973, o secretário de Estado Henry Kissinger fez um alerta nuclear de alto nível. Era a sua maneira de advertir os russos para não interferir no curso da guerra árabe-israelense. Felizmente, não aconteceu nada.



O que fazer com as crises nucleares iranianas e norte-coreanas

No momento, a questão nuclear é frequentemente noticiada no caso da Coréia do Norte e do Irã.

Tomemos o caso do Irã, que é considerado no Ocidente – não no mundo árabe, e não na Ásia – a mais grave ameaça à paz mundial. É uma obsessão ocidental, e é interessante olhar para as razões disso, mas vou deixar de lado aqui. Existe uma maneira de lidar com a suposta grave ameaça à paz mundial? Uma forma, bonita e sensata, foi proposta dois meses atrás em uma reunião dos países não alinhados em Teerã. Na verdade, eles estavam apenas reiterando uma proposta que existe há décadas e foi aprovada pela Assembleia Geral da ONU.

A proposta é avançar para o estabelecimento de uma zona livre de armas nucleares na região. Isso não seria a resposta para tudo, mas seria um passo muito significativo adiante. E havia maneiras de proceder assim. O que aconteceu?

Você não vai ler sobre isso nos jornais porque não foi relatado – apenas em revistas especializadas. No início de novembro, o Irã concordou em participar da reunião. Dois dias depois, Obama cancelou a reunião, dizendo que não era o momento certo. O Parlamento Europeu emitiu uma declaração pedindo para que ele confirmasse a presença, assim como os estados árabes. Nada resultou. Então, avançamos para sanções cada vez mais duras contra a população iraniana – sem ferir o regime — e talvez a guerra. Quem sabe o que vai acontecer?

No nordeste da Ásia, é a mesma coisa. A Coréia do Norte pode ser o país mais louco do mundo. É certamente um bom concorrente para esse título. Imagine a situação dos norte-coreanos.

Tenha em mente que a liderança norte-coreana provavelmente leu os relatórios militares públicos dos EUA explicando que, como tudo na Coréia do Norte tinha sido destruído, a Força Aérea seria enviada para destruir as barragens, enormes represas que controlavam o abastecimento de água – um crime de guerra, por sinal, pelo qual pessoas foram enforcadas em Nuremberg. E esses relatórios oficiais falavam animadamente sobre como era maravilhoso ver a água escorrendo, escavando os vales, e os asiáticos correndo em volta, tentando sobreviver. Os relatos exultavam sobre o que isso significava aqueles “asiáticos”, horrores além da nossa imaginação. Isso significava a destruição de sua cultura do arroz, que por sua vez significava fome e morte. Magnífico! Não está na nossa memória, mas está na deles.

Vamos voltar ao presente. Há uma história recente interessante. Em 1993, Israel e Coréia do Norte caminhavam na direção de um acordo em que a Coreia do Norte iria parar de enviar quaisquer mísseis ou tecnologia militar para o Oriente Médio e Israel iria reconhecer aquele país. O presidente Clinton interveio e bloqueou. Pouco depois, em represália, a Coreia do Norte realizou um teste de mísseis menor. Os EUA e a Coréia do Norte, em seguida, chegaram a um acordo em 1994, que interrompeu o esforço nuclear e foi mais ou menos honrado por ambos os lados. Quando George W. Bush chegou ao poder, a Coreia do Norte tinha talvez uma arma nuclear verificável e não estava produzindo mais nada.

Bush imediatamente lançou seu militarismo agressivo, ameaçando a Coréia do Norte – o “eixo do mal”. No momento em que Bush deixou o cargo, eles tinham de oito a 10 armas nucleares e um sistema de mísseis, outra grande conquista neocon. Nesse meio tempo, outras coisas aconteceram. Em 2005, os EUA e a Coréia do Norte chegaram a um acordo em que a Coreia do Norte acabaria com todas as armas nucleares e o desenvolvimento de mísseis. Em contrapartida, o Ocidente, principalmente nos Estados Unidos, proporcionaria um reator de água para suas necessidades médicas e daria fim a declarações agressivas. Eles, então, firmaram um pacto de não-agressão e se moveram em direção à acomodação.

Foi muito promissor, mas quase imediatamente Bush minou tudo. Ele retirou a oferta do reator de água leve e os programas para obrigar os bancos a interromper o processamento de todas as transações da Coréia do Norte, mesmo as perfeitamente legais. Os norte-coreanos reagiram reavivando seu programa de armas nucleares. E é isso o que vem acontecendo.

O que eles dizem é: é um regime muito louco. Você faz um gesto hostil e nós vamos responder com um gesto louco do nosso próprio país. Você faz um gesto acomodando a discussão e nós vamos retribuir de alguma forma.

Ultimamente, por exemplo, houve exercícios militares da Coreia do Sul e dos EUA na península coreana. Nós achamos que eles estavam ameaçando o Canadá de olho em nós. Os bombardeiros mais avançados da história, de Stealth B-2 a B-52s, estão realizando bombardeios nucleares simulados na fronteira da Coreia do Norte.

Isso certamente desencadeia o alarme do passado. Eles lembram que o que ocorreu e estão reagindo de uma forma muito agressiva, extrema. Bem, o que aparece no Ocidente é quão loucos e terríveis os líderes norte-coreanos são. Sim, eles são. Mas essa é quase toda a história.

Não é que não haja alternativas. As alternativas simplesmente não estão sendo consideradas. Isso é perigoso. Então, se você perguntar para onde o mundo está indo, não verá uma imagem bonita. A menos que as pessoas façam algo a respeito. Nós sempre podemos fazer.


A Extinção das Abelhas provocada pela Monsanto e Syngenta - Comprovação das Revelações Maias

Por Almeida

Do ODiario.info
A Rússia adverte Obama: Aproxima-se a batalha global sobre o «apocalipse da abelha»





The European Union Times 

Como este texto ilustra até à saciedade, de pouco valerão as legítimas preocupações ambientais se for deixada de lado a luta contra o sistema do capital e a sua insaciável procura do lucro máximo.

E nesta procura sem fim, os crimes cometidos pelo funcionamento do sistema ficam impunes e nem sequer têm moldura penal prevista.

Até quando?

As importantes actas relativas à reunião da semana passada entre o presidente Putin e o secretário de Estado dos EUA, John Kerry, revelam a «extrema indignação» dos dirigentes russos com o regime de protecção permanente do presidente Obama aos grandes gigantes mundiais da biogenética, Syngenta e Monsanto, perante o eminente «apocalipse das abelhas» que, segundo o Kremlin, «seguramente» pode levar a uma guerra mundial.

Segundo as ditas actas publicadas no Kremlin pelo Ministério dos Recursos naturais e o Meio Ambiente da Federação Russa (MNRE), Putin estava tão indignado com a negativa de Obama em discutir este assunto que, inclusive durante 3 horas, recusou reunir-se com Kerry, que tinha ido a Moscovo em missão diplomática, cedendo mais tarde para não provocar uma maior ruptura entre as duas nações.

No centro da disputa entre a Rússia e os EUA, de acordo com o MNRE, está a «indiscutível evidência» de que determinado tipo de insecticidas neuro-activos relacionados com a nicotina, e conhecidos pelo nome de neonicotóides, estarem a destruir a população de abelhas do nosso planeta, e que, a não ser controlada, poderá destruir a capacidade mundial de cultivar alimentos suficientes para a população.

A situação tornou-se tão grave, informa o MNRE, que a Comissão Europeia votou na semana passada por, unanimidade, uma proibição cautelar de 2 anos (entrará em vigor a 1 de Dezembro de 2013) para os pesticidas mata-abelhas, seguindo o exemplo da Suíça, França, Itália, Rússia, Eslovénia ou Ucrânia, países que tinham proibido anteriormente a utilização destes perigosos organismos geneticamente modificados.

Dois dos mais temidos neonicotóides que agora foram proibidos são o Actara e o Cruiser, fabricados pelo gigante suíço de sementes e pesticidas biotecnológicos, Syngenta AG, que dá emprego a mais de 26.000 pessoas em cerca de 90 países, e que ocupa o terceiro lugar do ranking mundial de vendas no mercado mundial de sementes para a agricultura.

É importante ter em conta, diz o relatório, que a Syngenta, juntamente com outros gigantes da biotecnologia como a Monsanto, a Bayer, Down e DuPont controlam actualmente cerca de 100% do mercado mundial de pesticidas, plantas e sementes geneticamente modificados.

No caso da Syngenta também é importante destacar, continua o informe, que em 2012 foi criminalmente acusada na Alemanha por ter ocultado o facto de o seu milho geneticamente alterado ter morto gado, e que se tinha feito um processo colectivo com o valor de 105 milhões de dólares nos EUA, depois de se descobrir que tinha contaminado o fornecimento de água de cerca de 52 milhões de estadunidenses em mais de 2.000 distritos, com o seu herbicida Atracina, que pode provocar mudanças de género nos animais.

A espantosa situação pode ver-se, segundo o MNRE, no relatório feito no passado mês de Março pelo American Bird Conservancy (ABC), que alerta para o perigo em que se encontra o mundo, onde podemos ler o seguinte:

«Como parte de um estudo sobre os efeitos do tipo de insecticidas mais utilizado no mundo, os neonicotóides, a American Bird Conservancy (ABC) fez um apelo à proibição da sua utilização como tratamento de sementeiras, bem como a suspensão de todas as encomendas em lista de espera até uma revisão independente dos efeitos dos ditos produtos nas aves, invertebrados terrestres ou aquáticos e nos restantes animais selvagens».

«Está claro que estes químicos têm potencial para afectar toda a cadeia alimentar. A persistência dos neonicotóides no meio ambiente, a sua propensão se encaminhar para os esgotos e infiltrações nas águas subterrâneas, tal como a sua acumulação, em grande parte irreversível, e a forma como actua nos invertebrados coloca problemas ambientais significativos», disse Cynthia Palmer, co-autora do relatório e directora do Programa para Pesticidas do ABC, uma das organizações líderes nos EUA para a conservação das aves.

A ABC encarregou o mundialmente reconhecido toxicólogo ambiental, dr. Pierre Mineau de dirigir a investigação. O relatório de 100 páginas, «O impacte nas aves do insecticida mais utilizado no país», refuta 200 estudos sobre os neonicotóides, incluindo a investigação da indústria conseguida devido à Lei da liberdade de informação dos EUA. O relatório avalia o risco toxicológico para as aves e os sistemas aquáticos e inclui comparações extensas com outros pesticidas anteriores que foram substituídos pelos neonicotóides. A avaliação conclui que os neonicotóides são letais para as aves e para os sistemas aquáticos de que elas dependem.

«Um só grão de milho pulverizado com neonicotóides pode matar um pássaro», disse Palmer. «Inclusive um ínfimo grão de trigo ou cevada tratado com o mais antigo dos neonicotóides – chamado imicloprid – pode envenenar fatalmente uma ave. Apenas uma décima parte de uma semente de milho coberta de neonicotóides por dia durante a época de incubação pode afectar a reprodução».

O novo relatório conclui que os níveis de contaminação dos neo-nicotóides, tanto das águas superficiais como das águas subterrâneas nos EUA e no mundo estão para lá do limiar conhecido por matar invertebrados aquáticos.

Depois deste relatório condenatório, o MNRE disse que um grande grupo de apicultores estadunidenses e ambientalistas processaram o regime de Obama pelo uso continuado destes neonicotóides dizendo: «Vamos levar a EPA (Environmental Protection Agency) a tribunal pelo seu fracasso na protecção das abelhas dos pesticidas. Apesar do nosso enorme esforço para alertar a Agência sobre os problemas que colocam os neonicotóides, a EPA continuou a ignorar os evidentes sinais de alerta de um sistema agrícola em dificuldade».

E quanto de mal se tornou o sistema agrícola devido a estas plantas, pesticidas e sementes geneticamente modificadas pode ver-se, segundo o relatório, na proposta da UE de há dias, seguida da proibição dos neo-nicotóides, e da proposta de criminalização de praticamente todas as sementes e plantas não registadas na UE, onde podemos ler o seguinte:

«A Europa apressa-se para regressar aos dias bons de 1939, 40, … Uma nova lei proposta pela Comissão Europeia poderá ilegalizar a cultura, a reprodução ou a comercialização de qualquer semente vegetal que não tenha sido experimentada, aprovada e aceite por um novo organismo europeu chamado “Agência de Variedades Vegetais da União Europeia”».

A nova Lei de Material Reprodutivo das plantas da UE nasce com com o objectivo de serem os governos quem se encarregue de praticamente todas as plantas e sementes. Aqueles agricultores e jardineiros que cultivem as suas próprias plantas a partir de sementes não reguladas poderão ser considerados criminosos segundo esta lei.

O relatório do MNRE sublinha que, apesar desta acção da EU poder parecer draconiana, ela é, no entanto, totalmente necessária para retirar o continente da permanente contaminação destas «semente monstruosas» criadas geneticamente.

O mais desconcertante de tudo e o que enfureceu Putin, diz o MNRE, foram os esforços do regime de Obama em proteger os lucros dos produtores de pesticidas à custa do prejuízo catastrófico a que se está a expor o meio-ambiente, como detalha o serviço de notícias do Guardian num artigo de 2 de Maio, intitulado «Os EUA rejeitam a alegação da UE de serem os pesticidas a principal razão do colapso das colónias de abelhas, onde se pode ler:

«A UE votou esta semana a favor de uma proibição de 2 anos para um tipo de pesticidas conhecidos como neonicotóides, que foram associados à morte das abelhas». O governo dos EUA, ao contrário, diz ter encontrado múltiplas razões para a morte das colmeias».

Para uma informação «mais verdadeira» da protecção de Obama aos gigantes da biotecnologia, o MNRE diz que se pode ler um outro relatório intitulado «Como Barack Obama se tornou no homem da Monsanto em Washington”, onde se chega a afirmar o seguinte:

«Depois da sua vitória nas eleições de 2008, Obama nomeou gente da Monsanto para lugares-chave daquelas agências federais que têm uma força tremenda em problemas de alimentação, a USDA e a FDA: na USDA colocou Roger Beachy, antigo director da Monsanto Danforth Center, como director do Instituto Nacional de Alimentação e Agricultura; na FDA colocou o novo Czar das questões de segurança alimentar, o infame Michael Taylor, antigo vice-presidente para as políticas públicas da Monsanto como comissário adjunto. Taylor tinha sido fundamental para a aprovação da hormona de crescimento bovino da engenharia genética da Monsanto».

Pior ainda, depois de a Rússia ter suspendido a importação e o uso do milho geneticamente modificado da Monsanto, após a leitura de um estudo que sugeria a sua relação com o cancro da mama em Setembro passado, o serviço noticioso de Rússia Today informou qual a resposta de Obama:

«A Câmara de Representantes dos EUA aprovou à última da hora da semana passada a incorporação na Lei de atribuições agrícolas de 2013 de uma disposição que protege as sementes geneticamente modificadas de litígios perante riscos sanitários.

A disposição, que se conhece oficialmente como a Farmer Assurance Provision, foi ridicularizada pelos opositores do lobby biotecnológico como a “Monsanto Protection Act”, já que retira aos tribunais federais a autoridade de proibir de imediato a sementeira e venda de sementes geneticamente modificadas (OGM), independentemente da preocupação dos consumidores com a saúde.

A disposição, também denunciada como “clausula biotecnológica”, deveria ter sido discutida pelos comités de agricultura antes da sua revisão. Pelo contrário, não se fizeram quaisquer sessões e o assunto era desconhecido da maioria dos democratas (detinham a maioria no Senado) antes da sua aprovação como parte do HR993, a Lei de financiamento a curto prazo que se aprovou para evitar o derrube do governo federal».

Em 26 de Março, Obama assinava a Monsanto Protection Act, garantindo assim que o povo estadunidense não possa recorrer aos tribunais contra o gigante da biotecnologia quando milhões deles caírem doentes, e muitos deles acabem certamente por morrer no que o MNRE chama o maior apocalipse agrícola da história da humanidade, enquanto 90% das abelhas selvagens morreram e cerca de 80% das domésticas também.

Este texto foi publicado em http://www.eutimes.net/2013/05/russia-warns-obama-global-war-over-bee-apocalypse-coming-soon/

Tradução de José Paulo Gascão

quarta-feira, 5 de junho de 2013

Maria Madalena afogando o ganso de Jesus - Sociedade Suja Infecta o País com Preconceito




Nesta manhã de quarta-feira, 05 de junho, acordamos com a notícia da exoneração do Diretor do Departamento de DST/AIDS e Hepatites Virais, Dirceu Greco pelo Ministro da Saúde, em função de publicidade sobre prevenção de DST veiculada no dia Internacional da Prostituta.

O Professor Dirceu Greco é um eminente infectologista, professor titular da UFMG, e um dos pioneiros da Bioética brasileira. Seu trabalho à frente do Departamento DST/AIDS tem o reconhecimento da comunidade acadêmica, da área técnica do Ministério da Saúde e dos movimentos sociais de pessoas vivendo com AIDS e outras DST. Durante sua gestão, os dados demonstram ampliação de cobertura no acesso a tratamento e maior eficiência de medidas preventivas. Além disso, o Departamento pautou-se por uma construção de atuação a partir do diálogo com grupos sociais estigmatizados, contribuindo para autoestima desses grupos, redução da discriminação e elaboração de ações com maior poder de aceitabilidade.

E foi justamente em uma oficina sobre prevenção de DST/AIDS com prostitutas, de onde emergiram as ideias para a publicidade. Em um dos cartazes, uma mulher comum sopra um beijo na palma da mão e diz: “Um beijo para você que usa camisinha e se protege de HIV/AIDS, DST e Hepatites Virais”. No outro, uma outra mulher comum bate no peito e diz: “Sou feliz sendo prostituta”.

Este segundo cartaz foi o que parece ter despertado a maior indignação. Segundo os jornais foram as pressões da bancada evangélica que levou o ministro a exonerar o Prof. Dirceu Greco em 72 horas após a veiculação. O atual presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, Deputado Marco Feliciano classificou de “famigerada” a campanha. Um outro deputado, compara prostitutas a portadores de perversões, quando disse esperar agora, uma campanha que diga: “sou pedófilo, sou feliz” e uma outra deputada afirmou que era um desserviço à sociedade, pois a condição dessas mulheres não lhe permitem serem felizes.

O filósofo Friedrich Nietzsche criou a expressão “moralina” para designar uma espécie de produto subjetivo tóxico que escorre de uma moral própria daqueles que negam a realidade como ela é, e que põe seus valores abstratos, seus conceitos autônomos acima da verdade da vida e do sofrimento. Segundo o filósofo, essa moralina não é senão uma moral superficial e hipócrita que se infiltra no tecido social e nas estruturas do Estado, como expressão de ódio e de apetite de vingança pelos diferentes. Ela inspira então ações estratégicas para enquadrar os diferentes em seu padrão de moralidade.

Adequando à nossa realidade, podemos constatar que é fruto dessa moralina a proposta de tratar a homossexualidade como doença, ignorando toda a produção antropológica e histórica que demonstra nunca ter havido civilização sem homossexualidade e de serem muitas e variadas as visões morais criadas sobre esse comportamento através dos lugares e tempos. É ela também que inspira a postura de ignorar estrategicamente a existência das prostitutas e ignorando-as, permitir que sofram violência, que sejam exploradas no trabalho, e que se lhes negue o direito à autoestima e à felicidade. A moralina brasileira parece querê-las sempre no lugar de Madalenas apedrejadas, à espera de redenção.

Triste é ver como os acordos políticos e os projetos de poder nesse país tem contribuído para a manutenção e expansão tóxica dessa moralina na sociedade brasileira. Parabenizo o Prof. Dirceu Greco e sua equipe, por terem encarado a realidade. É preciso que as campanhas de prevenção de DST/AIDS e Hepatites Virais cheguem aos milhares de cabarés existentes no país, e nos bares de beira de estrada, é preciso que as campanhas não tenham conteúdos culpabilizadores nem vitimizadores dos comportamentos, para que possam comunicar-se efetivamente com os sujeitos alvos. Lamento a fraqueza do Ministério em fazer com que o país perca um gestor dessa qualidade para agradar aqueles que considera parte importante do seu projeto de governabilidade.

Comecei e termino com Nietzsche:

“Para o forte, o conhecimento, o dizer sim à realidade é uma necessidade, tal como para o fraco, sob a inspiração da fraqueza, também é uma necessidade a covardia e a fuga perante a realidade.”

Cláudio Lorenzo

Presidente da Sociedade Brasileira de Bioética

terça-feira, 4 de junho de 2013

Cronica de uma morte anunciada - Funai ferida de morte


Rasgando a Ordem de Reintegração de Posse emitida por toga sem mácula
A Revelia da História do Brasil



Um índio foi baleado na tarde desta terça-feira na região de fazendas ocupadas por um grupo de terenas em Sidrolândia, a 70 quilômetros de Campo Grande (MS). O índio da etnia Terena Josiel Gabriel Alves, 34 anos, deu entrada no Hospital Sociedade Beneficente Dona Elmiria Silverio Barbosa às 16h30. Outros dois indígenas estão desaparecidos depois do ataque, informou à agência Efe um porta-voz do Conselho Indigenista Missionário (Cimi).
Exames indicaram que a bala ficou alojada próximo à coluna cervical, o que determinou sua transferência para a Santa Casa de Campo Grande. Mara Gonçalves, funcionária da Sociedade Beneficente, disse à Agência Brasil que o índio saiu do hospital consciente, estável e conversando, mas não descartou a possibilidade de sequelas no sistema motor. A Santa Casa de Campo Grande confirmou que Alves deu entrada consciente, mas não se pronunciaria sobre o seu estado de saúde.

Sidrolândia tem sido alvo de conflitos entre fazendeiros e índios desde o dia 15 de maio quando os terena ocuparam quatro fazendas na região. Uma delas, a Fazenda Buriti, foi o local onde o índio terena Osiel Gabriel, 35 anos, foi morto e mais três índios ficaram feridos durante uma ação de reintegração de posse, comandada pela Polícia Federal, no último dia 30.

Em nota divulgada na noite de sexta-feira, a Funai criticou o cumprimento da ordem de desocupação da fazenda Buriti e disse que não foi informada sobre a operação. O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, pediu rigor na apuração do caso e disse hoje que vai atender o pedido do governador de Mato Grosso do Sul, André Puccinelli, e enviar 110 homens da Força Nacional de Segurança ao Estado.

Ontem, cerca de 200 índios e trabalhadores rurais sem terra iniciaram uma marcha em direção a Campo Grande. Organizado por organizações sociais, o movimento cobra a demarcação de terras indígenas e quilombolas e reforma agrária.

Enterro de Osiel assassinado pela repressão


Procuradores da República em Mato Grosso do Sul e no Pará se manifestaram hoje sobre os conflitos decorrentes da disputa por terras entre índios e produtores rurais. Por meio de notas divulgadas nos sites das procuradorias nos dois Estados, eles dizem que a questão da demarcação de terras indígenas é um problema cuja solução depende, principalmente, de vontade política.

A Advocacia-Geral da União (AGU) irá recorrer da decisão judicial que determinou reintegração de posse na Fazenda Buriti, em Mato Grosso do Sul, no prazo de 48 horas. O prazo vence amanhã. O objetivo é conseguir mais tempo para negociar a retirada dos indígenas que ocuparam o local. A União também vai pedir a reconsideração de multas pelo não cumprimento da decisão.
Segundo a Fundação Nacional do Índio (Funai), a disputa por terras, causa dos confrontos entre índios e fazendeiros, se arrasta desde, pelo menos, 1928, quando o antigo Serviço de Proteção ao Índio (SPI, órgão substituído pela Funai em 1967), criou uma reserva terena com 2.090 hectares (um hectare corresponde a 10 mil metros quadrados, o equivalente a um campo de futebol oficial).

Em 2011, a Funai reconheceu como território tradicional indígena os 17 mil hectares reivindicados pelos índios. Fazendeiros que ocupam a área, em alguns casos há décadas e regularizados, conseguiram que a Justiça Federal em Campo Grande anulasse os processos de reconhecimento e homologação.

Aldeia Profanada

sábado, 1 de junho de 2013

Genocídio - As armas de destruição de massas dos EUA no Iraque

A poeira do Iraque invade as longas estradas que são os dedos do deserto. Ela entra pelos olhos, nariz e garganta; rodopia em mercados e pátios escolares, contaminando crianças a chutarem uma bola; e transporta, segundo o Dr. Jawad Al-Ali, "as sementes da nossa morte".
John Pilger


Um especialista em câncer reputado internacionalmente que trabalha no Sadr Teaching Hospital, em Bassorá, o Dr. Ali disse-me isso em 1999 - e hoje a sua advertência é irrefutável. "Antes da Guerra do Golfo", disse ele, "tínhamos dois ou três pacientes de câncer por mês. Agora temos 30 s 35 a morrerem a cada mês. Nossos estudos indicam que 40 a 49 por cento da população nesta área contrairá câncer: num período de tempo de cinco anos para começar, a seguir pouco mais. Isso é quase a metade da população. A maior parte da minha própria família contraiu e nós não temos historial da doença. Aqui é como em Chernobil; os efeitos genéticos são novos para nós; os cogumelos crescem enormemente; mesmo as uvas no meu jardim sofreram mutações e não podem ser comidas".
Ao longo do corredor, a Dra. Ginan Ghalib Hassen, uma pediatra, mantém uma colecção de fotos das crianças que estava tentar a salvar. Muitas têm neuroplastoma. "Antes da guerra, em dois anos vimos apenas um caso deste tumor inabitual", disse ela. "Agora temos muitos casos, sobretudo sem historial familiar. Estudei o que aconteceu em Hiroshima. O aumento súbito de malformações congénitas é o mesmo".
Entre os médicos que entrevistei havia pouca dúvida de que as munições de urânio empobrecido (depleted uranium, DU) utilizadas pelos americanos e britânicos na Guerra do Golfo fossem a causa. Um médico militar dos EUA designado para limpar o campo de batalha da Guerra do Golfo ao longo da fronteira no Kuwait afirmou: "Cada rajada disparada por um ataque de avião A-10 Warthog transportava mais de 4.500 gramas de urânio sólido. Bem mais de 300 toneladas de DU foram utilizadas. Foi uma forma de guerra nuclear".
Embora a ligação com o câncer seja sempre difícil de provar absolutamente, os médicos iraquianos argumentam que "a epidemia fala por si mesma". O oncologista britânico Karol Sikora, chefe do programa de câncer da Organização Mundial de Saúde (OMS) na década de 1990, escreveu no British Medical Journal: "Equipamentos de radioterapia, drogas de quimioterapia e analgésicos são sistematicamente bloqueados pelos conselheiros dos Estados Unidos e Grã-Bretanha [no Comité de Sanções ao Iraque]". Ele acrescentou: "Disseram-nos especificamente [por parte da OMS] para não falar acerca de todo o assunto do Iraque. A OMS não é uma organização que goste de se envolver em política".
Recentemente, Hans von Sponeck, o antigo assistente do secretário-geral das Nações Unidas e alto responsável humanitário da ONU no Iraque, escreveu-me: "O governo dos EUA procurou impedir a OMS de inspecionar áreas no Sul do Iraque onde foi utilizado urânio empobrecido e provocou graves perigos de saúde e ambientais".
Hoje, relata a OMS, o resultado de um estudo fundamental efectuado em conjunto com o Ministério da Saúde do Iraque foi "adiado". Cobrindo 10.800 famílias, ele contém "evidência incriminatória", diz um responsável do ministério e, segundo um dos seus investigadores, permanece "top secret". O relatório diz que defeitos de nascimento ascenderam até uma "crise" por toda a sociedade iraquiana onde DU e outros metais pesados tóxicos foram utilizados pelos estado-unidenses e britânicos. Catorze anos depois de soar o alarme, o Dr. Jawad Al-Ali relata "fenomenais" casos de câncer múltiplo em famílias inteiras.




O Iraque já não é notícia. Na semana passada, a morte de 57 iraquianos num dia foi um não acontecimento em comparação com o assassínio de um soldados britânico em Londres. Mas as duas atrocidades estão conectadas. O seu emblema pode ser um dispendioso novo filme de "The Great Gatsby", de F. Scott Fitzgerald. Dois dos principais personagens, como escreveu Fitzgerald, "destroem coisas e criatura e retiram-se de volta para o refúgio do seu dinheiro ou para a sua ampla indiferença... e deixam outras pessoas limparem a sujeira".
A "sujeira" deixada por George Bush e Tony Blair no Iraque é uma guerra sectária, as bombas de 7/7 e agora um homem a agitar um sangrento cutelo de carne em Woolwich. Bush retirou-se para a sua "biblioteca e museu presidencial" Mickey Mouse e Tony Blair para as suas viagens de gralha e o seu dinheiro.
A sua "sujeira" é um crime de proporções monstruosas, escreveu Von Sponeck, referindo-se à estimativa do Ministério de Assuntos Sociais iraquiano de 4,5 milhões de crianças que perderam ambos os pais. "Isto significa que uma horrenda proporção de 14,5 por cento da população do Iraque é constituída por órfãos", escreveu. "Estima-se que um milhão da famílias são dirigida por mulheres, a maior parte delas viúva". A violência doméstica e o abuso de crianças são certamente questões urgentes na Grã-Bretanha; no Iraque a catástrofe inflamada ela Grã-Bretanha trouxe violência e abuso a milhões de lares.
No seu livro "Telegramas do lado escuro" ("'Dispatches from the Dark Side"), Gareth Peirce, a grande advogada britânica de direitos humanos, aplica a regra da lei a Blair, ao seu propagandista Alastair Campbel e ao seu gabinete de ministros coniventes. Para Blair, escreveu ela, "seres humanos que se presume possuírem pontos de vista [islâmicos] deviam ser incapacitados por quaisquer meios possíveis e permanentemente... na linguagem de Blair um "vírus" a ser "eliminado" e exigindo "uma miríade de intervenções [sic] profunda nos assuntos de outras nações". O próprio conceito de guerra sofreu mutação para "nossos valores versus os seus". E ainda assim, afirma Peirce, "as séries de emails, comunicados internos do governo, não revelam dissenção".
Para o secretário dos Negócios Estrangeiros Jack Straw, enviar cidadãos britânicos inocentes para Guantanamo era "o melhor meio de cumprir nosso objectivo contra o terrorismo". Estes crimes, sua iniquidade a par com o de Woolwich, aguardam processo. Mas quem os exigirá? No teatro kabuki da política de Westminster, a violência distante dos "nossos valores" não tem interesse. Será que nós os restantes também viraremos as costas?